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Gestão Dinâmica do Espectro e Diversidade

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Gestão Dinâmica do Espectro e Diversidade

Compartilho o texto abaixo enviado pelo Thiago Novaes para o Grupo do GTCD no yahoogrupos por entender que é um debate importante de ser levantado dentro do GT CUltura Digital
 
1. Introdução
 
Este breve documento tem por objetivo subsidiar a elaboração e aprimoramento de políticas culturais que necessitem do uso e compartilhamento do espectro radioelétrico, buscando nas novas possibilidades de gestão dinâmica do espectro [1] a garantia de direitos previstos na Constituição Federal do Brasil.
 
Entre os dispositivos constitucionais que orientam esse texto, destacam-se: o pleno exercício dos direitos culturais, da liberdade de expressão e a complementaridade dos serviços privado, público e estatal de comunicação social.
 
  • "O  Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais" (Art 215);
 
  • "é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença (Art. 5o, inciso IX);
 
  • "Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de  radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal (Art. 223);
 
 
2. Aspectos Jurídicos para Gestão do Espectro 
 
Do ponto de vista jurídico, o espectro constitui um bem público. O inciso XXI do artigo 4o da Resolução n.o 259/2001/Anatel define o espectro de radiofrequências como “o bem público, de fruição limitada, cujo uso é administrado pela Agência, que corresponde a uma parte do espectro eletromagnético abaixo de 3.000 GHz, que se propaga no espaço sem guia artificial e que é, do ponto de vista do conhecimento tecnológico atual, passível de uso por sistemas de radiocomunicação”.
 
Os bens públicos podem ser divididos em res publicae ou em res comunis omnium. Como res publicae, o espectro seria um bem público propriamente dito, de propriedade do Estado e por ele disciplinado e regulado. No sentido romano de res communis omnium, o espectro seria um bem pertencente a todos, a toda a coletividade (Kiss, 1985, p. 423-441 apud Pinheiro, 2013, p. 190).
 
Considerando ainda o Art. 225 ("Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações"), poder-se-ia ainda especular sobre a necessidade de uma avaliação mais cuidadosa sobre o uso potencialmente danoso do espectro, impondo-se limites e parâmetros técnicos claros de propagação de ondas [2]. A alternativa jurídica para uma gestão ecologicamente adequada do espectro aponta para sua municipalização, acompanhada de relatório técnico de impacto ambiental (Silveira, 2001; Fiorillo, 2000).
 
Sobre a complementaridade dos serviços privado, público e estatal, ainda sem a devida regulação no Brasil, inspiram-nos as recentes leis promulgadas na Argentina, Bolívia e Equador.
 
  • Argentina: a Lei 26.522 de serviços de comunicação audiovisual, de 2009, reserva 33% dos espaços radioelétricos disponíveis, em todas as bandas de radiodifusão sonora e de televisão terrestres, em todas as áreas de cobertura, para pessoa jurídicas sem fins de lucro. (Art. 89, f);
 
  • Bolívia: Lei Geral de Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação,  Lei Nº 164, 8 de agosto de 2011. c) Distribuição do espectro: a distribuição do total de canais da banda de frequências para o serviço de radiodifusão em frequência modulada e televisão analógica em nível nacional onde exista disponibilidade, se sujeitará ao seguinte: Estado,  com até 33%, Comercial, até 33% e Social comunitário, até 17%, Povos indígenas originários, campesinos, e as comunidades interculturais e afro-bolivianas até 17% (Art. 10, I);
 
  • Equador: “Las frecuencias del espectro radioeléctrico destinadas al  funcionamiento de estaciones de radio y televisión de señal abierta se distribuirá equitativamente en tres partes, reservando el 33% de estas  frecuencias para la operación de medios públicos, el 33% para la  operación de medios privados, y 34% para la operación de medios comunitarios" (Art. 106).
 
 
3. Espectro, Diversidade e Inovação
 
Embora o Brasil esteja na iminência de definir o padrão de rádio digital, já que a portaria ministerial 290 data de 2010, o decreto presidencial nº 8.139 autorizou a migração das emissoras de rádio que operam na faixa AM para a faixa FM [3], desconsiderando fatores técnicos da digitalização dessas emissoras, que proporcionam uma melhoria da qualidade de áudio, a multiprogramação, a diminuição do gasto de energia, o provimento de novos serviços e a otimização de uso do espectro, que revitalizam o uso do AM.
 
Supreende que tal medida tenha sido tomada para "atender a uma antiga solicitação de radiodifusores", podendo ser caracterizada como inoportuna, pois impõe um duplo custo para as emissoras: a compra de transmissores FM, e a posterior compra de transmissores digitais. Além disso, o decreto explicita em Art. 1º: "A extinção do serviço de radiodifusão sonora em ondas médias de caráter local", quando, na verdade, um dos padrões em avaliação para ser implementado no Sistema Brasileiro de Rádio Digital, o DRM [4], tem um desempenho excelente em ondas médias, tendo sido adotado na India e na Rússia, países de semelhante condição territorial continental!
 
Interessa-nos observar que ao extinguir a faixa AM, diminui-se o espaço de valorização e difusão das manifestações culturais pelo meio rádio, tal como previsto em nossa Carta Magna, e se ignora o processo em curso de digitalização.
 
A gestão mais eficiente do espectro, no entanto, caminha no sentido de aumentar a oferta de serviços e conteúdos, impulsionando a inovação, trazendo com novas tecnologias digitais o novo paradigma de gestão dinâmica do espectro. Como sugere o documento de 2013, da FCC (A Anatel dos EUA):
 
“Em vários casos, as novas e inovadoras tecnologias têm proporcionado os  meios para expandir a utilização do espectro não licenciado. Por exemplo, como resultado dos procedimentos de espaços em branco,  permitiram-se operar canais de TV sem uma licença específica, proporcionando acesso ao espectro por meio de um banco de dados e o uso de tecnologias de rádio cognitivo. A perspectiva de uso de tais  tecnologias avançadas também serviu como base potencial para o compartilhamento de outras partes do espectro, incluindo o espectro  utilizado pelo governo federal. Embora isto possua potenciais benefícios óbvios para um maior acesso ao espectro nos Estados Unidos, é provável  que outras partes do mundo venham a considerar abordagens semelhantes  para facilitar o crescimento e a inovação em dispositivos sem licença” [6].
 
O conflito que se anuncia opõe a concepção de res publicae à res comunis omnium, ou seja, entendido como propriedade do Estado, a tendência é que empresas de apoderem do uso do espectro, via leilão, em prejuízo do uso das pessoas, e das garantias fundamentais supracitadas, previstas na Constituição Federal do Brasil.
 
Neste sentido, torna-se imperativa a compreensão do Ministério da Cultura sobre o que representa gestão dinâmica do espectro para o pleno exercício dos direitos culturais, com especial atenção para o conceito de Espectro Livre: a liberação de faixas do espectro para acesso cidadão sem finalidade de lucro, garantindo a liberdade de expressão e a complementaridade dos serviços privado, público e estatal.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FIORILLO, Celso Pacheco Antonio [2000]. O Direito de Antena Em Face do Direito Ambiental no Brasil. São Paulo: Saraiva.
 
SILVEIRA, Fernando [2001]. Rádios Comunitárias. Belo Horizonte: Editora Del Rei.
 
PINHEIRO, Guilherme Nunes [2013]. "Uma Perspectiva Neoconstitucional da Regulação do Espectro Radioelétrico". REVISTA Direitos Humanos e Democracia, Editora Unijuí, ano 1, n. 2, jul./dez.
 
 

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